quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

"OLHARES"
























O teu amor preenche-me prenho de simplicidade
ficando eu sem espaço para o meu te perorar
a conhecer que já no sonho pensei de verdade.

Uma constante maresia carrego trazida do meu mar
que ocupa mais que parece a alma deixar de sobrar
nas lombadas escritas de ouro fino daquele de recordar.

 
Desarrumados das vidas que não seja de nos perdermos
por sinuosos e soltos sorrisos de lágrimas tão molhados
que escoem nos beirais das memórias dos dias passados.

Condenados estamos a não esquecer o acto de vivermos
se a insanidade em veneno nos toma e em nós persiste
se fraquejando o esforço de tanto querer ser feliz se desiste.


Como tela sem cor nem paleta tudo sai em tola pressa
como se suspiros de repuxos e pensares desalinhados
tratassem dessa dor que só meu eu inteiro tamanho a meça.
 

O teu amor perde-se no meu e a vida no horizonte
do tempo que sobra ao corpo fustigado que pressinto
de chuva e vento e dança como rio tão virgem de ponte. 





segunda-feira, 23 de outubro de 2017

"FAZES-ME BEM"
















Às vezes fazes com que tudo me pareça
simples solto lavado fácil de entender como
tu és fácil de perceber e eu me sinto difícil até
para me às vezes interessar por alguém que sinto
sem conhecer que a poderia reconhecer se largado
do preconceito me deixa-se aberto ao caminho da
simplicidade com as cores do quadro que pintas
no dia a dia carregado de amor e saudades repartidas
que se tornam para mim de tão simples que são assunto
delicado que não seguro por me parecer complicado de
mais do que penso ficando eu a cismar no erro e no errado.

Movimentos estes estranhos do pensar em que te
envolvo nas horas do dia em que me isola o tempo
real do tempo que gostaria de ter ainda de sobra
para voltar a tudo fazer mas com o teu jeito de ser
que sei ser impossível conquistar se sem no nada
acreditar que tudo pode ser diferente dependendo
da gente aproveitar a ocasião de fugir à solidão
que nos deixa ignorados como remendos mal
ensaiados em conversas desencontradas da hora
frias sem ser do tempo brancas de sujidade esquecida
que teimamos guardar em nós e dizer que é da idade.


Solta-se a vida em mil pedaços de papel ou cem
que voam ao encontro de tudo e do nada
mas por isso digo: que às vezes fazes-me bem !

E solta-se o antes esquecido perdido e desdenhado
nas teias do mar que o pensamento engana quem o tem 
volta de novo a frase sentida: que às vezes fazes-me bem !


 

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

" CISÃO "













Choves quase diariamente sobre mim
neste caminho que a custo percorremos
sobram horas teimosas perigosas dia a dia
deixando a escuridão mais negra do que devia.
A escada de pedra gasta a vida subindo para baixo sem se ver
levando o caminho para trás a correr sem se deixar perceber.
 
Despidos da roupa e da pele resta o lençol de ponto cruz 
inventado de marcas e feridas a que o tempo nos reduz
vive não reparando que ao passar nos deixa mais nus.
Adormecendo em livro de letras emprestadas salto linhas
do sonho em que as sentindo não adivinhei que tinhas 
reparando eu então no irreal se as ideias eram minhas.
 

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

"DISCORRIMENTO












Escorre a vida atrapalhada
com tudo às vezes sem nada
como se o tudo fosse inventado.
Escorrem os dias como contas
de um imenso terço gasto de rezas 
em remendos lascados ao acaso no tempo.
Escorre a angústia do dia seguinte
as folhas perdem-se nos caminhos e pressas
por não se saber se há dia seguinte.
Escorre a chuva embalada no vento.

Escorrem apressados os desejos
nos abraços esquecidos de dar
escorrem secos os rios sem pausas para pensar
no brilho que nos acorre escorrendo do olhar 
ao sentir o passado como se fosse presente.
Escorrem os dias como contas
de um imenso terço gasto de rezas
imersas em cores que fazemos por inventar
no tempo intenso difícil que nos escorre 
nos dedos anelados de lembranças.

Escorre o amor que sobra preocupado
como se corresse no tempo parado
na espera de melhores dias em soluções.
As memórias escorrem-nos aos tropeções
por palavras já escorridas de tanto sentir
escorrido sem sentido.
 

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

INSOLAÇÁO














Se Annata discorro alegre pela paixão
de longos tempos e desejados passos
arrumados na memória alegre e cheia
fica esta entristecida de luz por desmedida ideia
mortiça rude inapta qual desavisada rusga
que ateia assim tão indiferente desejo de fuga.

Sublime fervilha o sol bem aceso  
como a saudade que devora e alimenta
se descuidado penso dela estar abrigado
em sentimentos despidos regados de sentidos
de onde não conto antes do tempo fugir
onde ficar seria depois deixar-me fingir.

Sem vento visível penso porque ateou e ardeu
assim queimando o tão pouco do gesto simples
rasgado por viagem que a tanto custo nasceu
se depois transformada é de sonho em pesadelo
como se de castigo se tratasse cego sem dó 
dado a somente ternurento laço e não complicado nó

O trinado pode ser alegre confinado emoção
estragado lamento também se privado de razão
como por tanto sol se é vitima de insolação.


 

segunda-feira, 17 de julho de 2017

"NAS SOMBRAS DO SONHO"














Escoa-se o tempo pela alma atrapalhado
que não vivo pacificamente assim
se mais penso nos outros que em mim
deixando-me o pensar de modo estranho
com pesada sensação de viver desarrumado
não encontrando desculpa para pensar deste tamanho.

Gosto então de fechar os olhos como viagem
na sombra da memória mais ou menos desmaiada
que me diz às vezes tudo às vezes não me diz nada
onde às vezes sou imaginário centro outras margem.
 
Torno-me um desfocado lúcido por rostos que amei 
por rostos que amo e sombras tenebrosas que deixei
dizendo que sou fácil de amar sou mais fácil de desamar
é uma forma de castigo de um qualquer código paranormal
que me impede então deixar de ver o que vejo perfeitamente
explico-me bem tarde de mais penso mal em tempo real.

Faço um esforço para rever tudo em concreto
se vislumbro o que não quero apago e desligo
faz bem desligar o pensar se está emaranhado
o escuro torna-se mais claro na areia do deserto
que dentro dos olhos que trago a par comigo
e se cansam pela alma se no sonhar fico fechado.





 

sexta-feira, 7 de julho de 2017

"RETINAÇÃO"
















Ao luar
reparo no teu olhar
irradias o brilho do Sol
vestida ou nua
não interessa
que chova a mais
na minha rua
que as poças de água
salpiquem de lama a alma
como chuva irregular
e que já nem sinto
me esteja a molhar de mágoa.

Fico do teu  olhar suspenso
e preso
e do luar embalado e aceso
de actos perdidos
por portas de todas as cores
fechadas outras perdidas
de segredos proibidos.

Entre o desejo que me assola
e que não vejo
desapareço a espaços
espantado por ecos
que ouvindo me atrapalham o beijo
em andar  trôpego de passado
negro "desluarado".

Ao luar
fico parado a andar
como se o presente
não seja desta minha rua e tua
sem perceber
que me movo
tu és ausente
envolta que estás nos pingos de sombras
que caem sem parar e eu ver
o ror de nuvens furtivas a chegar
para nelas me perder de novo
no fundo do teu olhar.


 

terça-feira, 13 de junho de 2017

"SOBREMAR"
















Pego nas imagens perdidas ao acaso no ar
troco-as de posição 
ao prazer do coração do momento
que voa sobre o meu mar perdição
entre lugares e tempestades de vento
de sorte e arte rasante na voz que inventei
lembrança essa que se perde na saudade 
que percorro sem perceber se esse fim
alguma vez por fim desejei
se procuro então a razão na outra parte de mim. 

E abraçam-se memórias nas asas invertidas
sobre esse mar que volta de novo acordado
do dormir que sonhando pensei então voar
que a força do vento é tantas vezes seguidas.




quinta-feira, 25 de maio de 2017

"ENSAIO SOBRE A MEMÓRIA"















Nem sempre o caminho a que os pensamentos nos conduzem, são os mais recomendáveis.

As razões, prendem-se com a consciência adquirida nas páginas do tempo que lentamente paginamos na nossa vida sob a forma de memória.
Na idade que soma e segue, tentamos não perder o pé aos anos que se nos escapam, a par de uma crescente diminuição da capacidade para transmitir aos outros, aquilo que à mente (aparentemente saudável), nos aflora no desenho dos dias.
Na posse destes elementos intrínsecos ao vulgar ser humano, tudo se vai aos poucos modificando em processos lentos, por vezes lestos: Conforme vistos de fora ou vistos pelo próprio.

As reflexões se as há, são mais demoradas, mais ou menos mal dormidas e, amiúde, nós os interessados, não as conseguimos gerir na rotina que se instala despercebida.
Neste menu de emoções e sentimentos, vemos as distâncias crescerem e os erros aumentados sem razão aparente, mesmo que reportados a horizontes passados.

Os anos corroem o ser humano, desacertam-no, despertando-o para um passado que se evita recordar por parecer ser incompatível nas horas de decisão com que nos vamos deparando.
A critica que colocamos na observação dos outros, é mais suave se actual, mas mais severa, se não a conseguirmos descolar do passado.
Quer queiramos ou não, a análise memorial, torna-se confusa, os sonhos erráticos e dolorosos mais em nós próprios, do que nos que consideramos serem os catalisadores das nossas decisões, erros e omissões.

A memória tem destas coisas.

Com a passagem do tempo, um nevoeiro cobre-nos a memória, fazendo-nos regressar a uma navegação à vista (entre desculpas, por isso perigosa), para com aqueles que; achamos ser o alvo da nossa introspeção.
Quando a memória nos devia poupar, deixando-nos serenos e transparentes, tende a incessantemente nos fazer lembrar o contrário, levando-nos a relevar acontecimentos passados a que damos muita importância  se maus, enquanto os bons, permanecem em nós menos tempo que o desejável.

Se com os últimos podemos bem passar, nos outros (os maus), a memória torna-se tortura que nos invade o pouco tempo que esperamos pela frente. Somos assim (na minha opinião), incomodados pela nossa memória não tendo forma de lhe responder à letra, dado o esgotamento por expansão que ela mesma provoca já que dela estamos pela natureza sujeitos.

Parece-me assim, que na soma dos tempos em que ainda nos sentimos funcionáveis, somos vitimas de uma presença memorial às vezes cega que nos vai ocupando o espaço vital sempre de forma crescente.
Esta maneira de ser e estar na vida, torna-se por vezes insuportável. Parece fácil a fuga para a frente, por afirmação da razão ou razões nas atitudes tomadas como que  subtração desejável aos erros humanamente cometidos, sob a capa da verdade (que errar é humano).

As reações perante a memória, espoliadas de razão qualquer que seja o caminho escolhido, são sempre de dúbio resultado.
Quando não controladas e confinadas no limite do razoável, as nossas memórias e reações perante os desafios em ritmo crescente (quase sem darmos por isso), levam-nos por vezes a entrar em sentidos proibidos.


 

segunda-feira, 15 de maio de 2017

"OUTROS PASSOS"














Sinto os teus passos mesmo que a dormir
percorrem-me o sonho que faço deixar fluir.
Sigo os teus passos ligeiros com olhos de sorrir
nos olhares ternos sinceros das janelas por descobrir.


Passas e passo a mão em teus cabelos brilhantes
descuidados como os passos que por vezes vislumbrei
quando por perto de ti despercebido passei antes.
Vejo os teus passos mesmo que esteja mais escuro
sejam eles passos de dança de areia ou chão duro.

Passas por mim descuidada sem contudo me veres
pensando eu que passas sem tu saberes que eu sei
de um dia em que passo a passo passando por ti morrerei.


 

quinta-feira, 11 de maio de 2017

"EXPIAÇÃO"













Se algo em mim gostaria de aproveitar
seria decerto aquilo que deixei de praticar
escolhendo as palavras certas e todavia
conseguir pensar em tudo que guardo de ti.
Pensar nisso faz-me contudo mal hoje e fico
se neles deixo arder sem conta o pavio como
copo vulgar de fosco vidro meio cheio meio vazio
melhor parecendo elaborado raro e real penico.

Injusta justiça esta que me faz ao lado passar
de jardins de pedra que lentos revejo medrar
como terras deixadas lavradas em pousio
privadas de adubos que à toa desperdicei.
Fui falso cego e na cegueira fiquei leve vazio
como alvorada fresca que na noite inventei 
guardando nela a preceito outras lembranças
até que do cheio vaso somente resta-se um salpico.

 

quarta-feira, 26 de abril de 2017

"INTEMPORAL"
















O poema quando se solta paira como fumo no ar
em forma de arte ao acaso sem direção aparente 
ou validade no prazo de quem dele no peito o sente
no tempo sempre suspenso da descoberta ao acaso
do quem ganhou se perdendo no hora da criação
sem entre os dois haver  pesada contradição.

Saído do ventre da alma do fundo do nosso mar
o poema dá-se a ler desnudado à mercê da emoção
de quem se dele apodera para guardar no coração.


 
 

terça-feira, 18 de abril de 2017

"PRIVAÇÃO"
















Corre na vida em cega corrente o ribeiro
apertado nas margens dos seios do teu mar
levado nas cristas de tão eivada esperança
para essa foz que se renova em cada abraço
agitado que nos fazendo viver assim avança
mesmo que açoitados de agreste vento feio
descurando ele então se coração jaz prisioneiro. 

E os cabelos em fogo irado revoltos de luar
clamam por desejos prementes de afagos
como se bastassem gestos inventados dar
para que rua abandonada se tornasse estrada
solta e a salvo dos azares que nos tocaram
os lábios molhados ferventes ausentes amargos
privados que estão do sonho do tudo e do nada.

 

quinta-feira, 13 de abril de 2017

"DISSOLUÇÃO"












Nua aconchego-me ao lençol salpicado de sangue
não te pressinto o ser a imagem que de ti guardo
é a camisa fora das calças quando lesto fugiste
deixando-me a escurecer tão ferida e triste.
Dói-me o corpo por fora mesmo parado
dói-me o que sobra por dentro exangue
tenho o olhar lento o peito baixa e levanta sem eu ver 
enrolada sinto nos pés a minha camisa de seda rosa
oferta tua quando de mim parti para te conhecer.
 
Revolvo alegrias partilhadas antes de te enlouquecer
e tu adoidado me fazeres sorrir às estrelas distantes.
que ao luar deitados fazíamos por descobrir
tornasse-me baço o olhar sentindo um frio desconhecido antes
que teima em me deixar como rosa seda a desfalecer
perdida no medo gelado de me perder
sem uma oração que guardo mas não sei rezar.

 

 

sexta-feira, 7 de abril de 2017

"DESARRUMAÇÃO"












Se no sonho dos dias me desarrumo
fico assim por tempos desarrumado 

por parcelas salteadas que me invadem
sentindo eu delas me sentir desarmado.
 

Solta-se a vida do sentido e do rumo
como tocha ateada em fogo alheio
que ardendo me apanha em cheio
como a poema ardido em papel pardo.


A noite inteira é parceira da desarrumação
desfazendo o sonho que espalhado não arrumo
e me castiga então afastado que estou da paz
deixando que do mais ou menos tanto faz.
 

Se na palavra vislumbro nesga para nascer
arrumo as cinzas então deixando-a crescer
parecendo o desarrumo que o sonho tinha

soma imperfeita que no pensar eu retinha.


 

quarta-feira, 5 de abril de 2017

"PROCRATISNAÇÃO"
















Tenho-te no pensamento todo inteiro
todavia não me chegas aos dedos

como gostava e queria deitar-te
no branco do papel que me olha.

Vives-me nos poros difusos da pele
deixando-me inerte sem reação aparente
nesta corrente que me nasce de repente
perdida de leito que é rio feito de gente.

 
Revolvo-te as entranhas horas e dias
às vezes semanas até te tornar tema
dos segredos que me amarram às palavras
que quero soltar de mim no ar e largar.

Ficas-me na alma que não sei onde pára
sem saber eu o tempo que vou esperar
prenho por não quereres sair de mim.

Vai-me parecendo prolixo o desejado fim
que breve seria a escrita de tanto pensar
pronto que estou mesmo sem perceber

se te quero mesmo escrever
ou te para sempre guardar

dentro dos restos de mim
pertinho do coração
imperfeito de solidão.

 

terça-feira, 4 de abril de 2017

"SUBLIMAÇÃO"














Sobram poemas em rimas babadas
amores traiçoeiros azares de vida
saudades esquecidas lembradas dobradas
nus inteiros suspiros desejos fingidos
molduras de beijos bolas corações
hipóteses eróticas masturbações.

Vendem-se frases sublimes coisa e tal
tudo muito espiritual muito adocicado
patati patata tudo solto quase nada
tudo leveza pesada empatada
muito prazer ideal já que nada é real
pra parecer não pensar só aparecer.

A poesia tem esta eterna virtude
mesmo que abandonada ao vento
passa disfarçada por doce solicitude
sublimada que depois se deixa de amar
mascarada infeliz privada da virtude 
que cada um escolhe lhe querer dar.
 

sexta-feira, 31 de março de 2017

"RÉSTIA"














Se réstia de luz vejo em teus olhos
sopra-me a aragem do fim de tarde
que se deita ao pôr do sol pintando eu na tela
tu sorrindo sentada na mesma rocha
com uma saia de folhos debruados de alfazema
colhida do vaso que deixámos à janela.

Depois vamos os dois mar afora
numa viagem de vida sem hora e sem vela
que a história não se repete sem demora
como fogo lento que sem fumo arde
ao vento que se acordar levasse por distração
a razão do ser dos versos deste poema.


 

sexta-feira, 24 de março de 2017

"INCONGRUÊNCIAS"





















Se amor é coisa que arde
deixa-o arder
para eu ver.
Veremos depois os dois
cegamente até doer
o brilho que em nossos olhos
permanece.
Subimos numa montanha
em qualquer lado
de braço dado
pela caminho que desce.
Depois do amor
vestimos uma roupa de cor
discreta e secreta
para continuar
a amar.
Mesmo que chova
vamos ao sol secar
ou ao luar
até que a noite morra
ou nasça o dia.
Dá-me uma ajuda
que já me sobra
paciência
de perder a caminhada
para nada.
Eu bem me dizia
que também não seria
fácil de escrever
tamanha heresia
pois se amor é fogo
que arde
que seja para se ver.






 

segunda-feira, 20 de março de 2017

"DESTINAÇÃO"














Sentada no banco quase seco
o meu olhar húmido demora-se

nos pombos que namoram distraídos.
Vivo aqui.
Sou banqueira do meu saco de palha
parco de fé com dois nacos de pão
um já seco outro ainda não.

Estou muito bem não fosse este frio
que me trespassa o corpo falhado
e me seca os lábios que já não beijam

seja talvez por ter o rosto molhado.

Precisava de um banho de amor
se estão esquecidos de mim

que estejam.
Passam outras crianças a rir
de mãos dadas com a esperança
como passei assim também

que inda tenho lembrança.
Empresto amor se me calha ocasião
se a fome me aperta
sem promessas só moedas por bem
e alguns dias de renovada ilusão
que guardo na caixa da capela
que fecha à hora certa
se "Deus" cumprir o horário.


Caí neste banco não caí no chão
não se pode cair onde se já caiu

ao contrário.
Perdi até a noção se tenho coração
revejo-me na mente dos sonhos que pari
entremeados de pancada
nos dias e noites de desamor 

que não pedi.
Já são todos crescidos para nada.

Só a idade e o medo me amparam
nesta praça inteira desgraçada


Tenho muito pouco para dar
perdi-me do que é receber.
Os pombos voaram para o adro da capela
que os noivos saem ao som

do arroz.
Oiço gritos de desejos nos sorrisos às janelas.
Tive um dia assim de branco e rendas
ele de fato cinzento como o dia
oferta do Pai que lhe batia

e dava prendas.
Tudo passa por mim
agora só
neste banco meu jardim de dó e sentidos
que eles já são crescidos.

 

sexta-feira, 17 de março de 2017

"ENTRETECLAS"
















Do meu piano perdi o norte e o tom
como exaurido castelo existisse

privado de trancas
e ao sabor dos esforços me visse
sem saber se premir pretas
ou brancas.
Surdina sonata invento assim só
gratuita sem sol nem dó

por sons que me tomam
a noite que nos dias
morre
como o tempo que
de mim escorre.

Muito me fascina o som que me dás
saído das teclas pretas e brancas
premidas a duas ou quatro mãos

tanto faz.
O deleite de uma qualquer sonata
que de ti saia jaz

em prazer que tomo por dado
ao pensamento no andamento

em que esteja.
Dás-me vida e me seduzes

no tempo que me sobeja
mesmo privado eu seja de luzes.


 

sexta-feira, 10 de março de 2017

"ERUPÇÃO"
















Erupção de mim sai em lava incandescente
presente persistente
nestes tempos tão frágeis
sem meta ou fim que se deixe vislumbrar
pois que o destino não é de fiar

e a lava não se deixa aprisionar.

Corre lava...

Que lava esta que corrói a alma
tornando as intenções menos ágeis
ardendo nós em brandos lumes 
por pensamentos acesos
ficando em fogo deles presos
entre punhais de dois gumes.


Corre lava...

Que os tempos estão de feição
levados por esta estranha monção
em que cada um esbraceja
expondo à luz que a força sobeja
mesmo estando a lava seca e dura
como mal incandescente que perdura.