sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

"DIDI"















Didi passava todos os dias
na rua que era a sua.
e minha.
De vestidos coloridos
sob casaco desbotado
no seu andar arrastado
em sapatos desconfiados
do peso diário.
Levava sempre um saco
com qualquer coisa
e folhas de poemas na mão
que distribuía porta sim
porta não.
De cabelo grisalho
em cachos amolgados
pelo tempo
deixava bons dias
e dedos de conversa
nas rotinas da vida.

Olá Didi está tudo bem
perguntava no seu
sorriso de um dente só.
Tinha uns terrenos
para dar a um sobrinho
e uma magra reforma
para manter a história
de viver.

Didi não era o seu nome.
Júlia era a sua graça
Didi o seu modo
de tratar uma amiga
dos seus poemas
e desabafos perdidos.

Júlia vivia só com o gato
com a ausência
e com a solidão.
Foi encontrada na banheira
no fria e gelada
de vida.

Didi já não se deixa ver
na rua que era sua
muito menos dar a ler
poemas do sol e da lua.

 

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

"PERCEÇÃO"














Não percebi a tempo.
Havia uma fresta dissimulada
no amor que me destinavas.
Por falta de perceção
descuidei o tempo todo
perdendo-me em fugazes abstrações
que os sonhos me alcançavam
noites a fio detidas por dias a eito.

Como doente fico privado de alento
em porta invisível informe fechada
que antes aberta tardia passavas.
Por falta de perceção.
A realidade torna-se lama e lodo
deixando-se em estendais de sensações
que sem nexo ao vento ondulavam
ocupando-me o ar que perdia e o peito.

Nada de mais afinal estranho era
o tempo sem  tempo que se passou
deixando o sentido sem espaço e espera.

Roda-se o corpo perdido e a alma
se alma ainda teima e teimando existe
no sonho que noite após noite persiste.