quarta-feira, 20 de julho de 2011

"HISTÓRIAS DA ÁGUA DO MAR" II

 Decorreram 5 a 6 dias de mar  em que as tarefas diárias a par da repetida leitura das últimas e futuras cartas de amor e saudade eram quase o único sustento para a passagem do tempo.
O mar umas vezes agreste e eriçado e uma chuva própria de marujo visitava-nos amiúde promovendo o beliche a atracção principal sempre que possível.
Nada havia de empolgante e o Panamá não deixara saudades para lá da meia dúzia de "souvenirs" mais ou menos de mau gosto que por obrigações aberrantes se teima em comprar em todo o local que é novo durante as andanças da vida .

Estávamos a um dia da chegada à baía de Acapulco pelo que e por estarmos adiantados no tempo graças ao vento a favor até aí constante e amigo, se resolveu pairar.
Como de costume, lavar e pintar pela enésima vez  todas as partes do navio foi como sempre era , o sinal  que nos lembrava a todos o cheiro de terra e notícias  frescas.
O frenesim da limpeza e da pintura ao mesmo tempo alargava-nos o sorriso e diminuía o mal estar causado pela estadia longa ao sabor do vai e vem  daquele chão inquieto que habitáva-mos.
De Acapulco sabíamos ser um local famoso de turismo com belas praias e discotecas pelo que  todos  nos aprestávamos  para a descoberta das razões da fama e dos meandros da cidade.

Antes porém ! Quis o destino ou melhor a natureza, sujeitar-nos a um desafio não calculado pela rapidez com que chegou, sob a forma de uma violenta tempestade tropical que em minutos sobre nós desabou   transformando a tarde quente e sossegada numa noite escura e nada sossegada .
Instalou-se sem aviso prévio uma  verdadeira montanha russa em que o lado inclinado era sempre o mesmo e que alguns tiveram grandes dificuldades em suportar.
Rajadas de vento assustadoras a par de uma chuva grossa que doía no rosto deitou por "terra" os preparativos e o resto de tudo o que alegre e afanosamente se tinha procurado abrilhantar.

A inclinação a que fomos sujeitos pelo vento forte andou perto do limite de segurança e o pânico roçou mesmo os mais habituados a estas diabruras dos elementos naturais.
Encharcados e doridos da pancada fomos empurrados pelas vagas de vento e pelas vagas de mar que na escuridão apenas pressentíamos ser grandes e perigosas.
Acapulco parecia querer-nos  mostrar a sua fama de cidade irreverente e espetacular mas para azar nosso da pior forma possível.
Quem o Oceano percorre não precisa de ajudas nem divertimentos deste tipo. O  simples facto de nele andar  por dias e dias a fio é já motivo que chegue para excitar a alma e aguçar os sentidos.

Mas o mal estava feito e era meia noite quando ficámos cansados, molhados e desarrumados ao largo da baía de Acapulco que de bonita naquela altura para nós nada tinha, já que com tanta chuva nem o resplendor da cidade que se dizia  fascinantes víslumbrávamos.
Sem poder aterrar devido ao estado de sítio porque passávamos, passámos o resto da noite a reparar estragos e a posar para a maior trovoada e para os maiores raios  que alguma vêz na vida tinhamos (pelo menos a maior parte de nós) deparado.

Dir-se ia que todos de terra disparavam os seus flash em busca da melhor fotografia para a nossa bela barca.
Um dos flash foi tão "curioso" que entrou pelo mastro da mezena com o estrondo respectivo e depois de descer e rebentar com todos os equipamentos electricos saíu airosamente atrapalhando suponho a fauna que por perto deveria andar.
Foi uma noite de Santo António e a premonição de que iríamos encontrar uma cidade excitante de luz e cor de ruído e movimento.
A premonição estava certa.

Pouco se dormiu e pela manhã, entrámos quase que lavados de mais,  frescos e airosos, na agora bela baía de Acapulco seguidos pelo olhar de milhares de pessoas que nos recebiam sorrindo como se nada de mais tivesse ocorrido a tão "belos Globetrotter" dos mares.

Sem comentários:

Enviar um comentário